Por David Rothkopf, Editor do grupo FOREIGN POLICY
Se Ashton Carter for confirmado o próximo secretário da Defesa dos Estados Unidos, ele continuará uma importante tradição que vinha sendo subestimada em seu gabinete. Médico de formação, Carter será o último de uma distinta linha de cientistas escolhidos para a Defesa que serviram os EUA e também a comunidade da defesa. Entre eles, Harold Brown, e um dos mentores de Carter, William Perry.
Lembro que falei a este respeito com Brown, há tempos, e ele lamentou que, nos últimos anos, muito frequentemente o cargo foi ocupado por profissionais da política, que não deram a devida atenção à compreensão do papel fundamental da tecnologia, da inovação e do rigor intelectual exigidos pela função.
Carter é brilhante, cheio de energia e criativo, como demonstrou em cargos anteriores que exerceu nos Departamentos da Defesa de Bill Clinton e de Barack Obama. Também é durão, e manifestará sem titubear seus pontos de vista num governo que se beneficiará de sua visão realista. Além disso, ele traz para a posição a necessária flexibilidade.
Mas, apesar de Carter ser uma escolha muito valiosa, não posso deixar de ressaltar que há razões importantes pelas quais devemos prever que tudo isso acabará em nada. A primeira razão, evidentemente, é que nenhum dos três primeiros secretários de Defesa de Obama saiu com um grande sorriso. Basta lembrar dos livros de Robert Gates e de Leon Panetta que prometiam “contar tudo” e o fato de o presidente ter destituído recentemente sem a menor cerimônia seu “amigo” Chuck Hagel.
Deve haver alguma raiz comum para as amargas experiências que marcaram as relações entre a Casa Branca e o Pentágono. Me vem à mente o processo interrompido do Conselho de Segurança Nacional (CSN) deste governo e, em particular, a equipe de segurança nacional da Casa Branca que está tremendamente inchada.
Agora são cerca de 400 pessoas, o que constitui um problema em vários níveis. Ele reflete e revela a centralização da tomada de decisões a respeito de uma lista cada vez maior de temas na Casa Branca.
Quatrocentas pessoas é muita gente, mas não é suficiente para que a equipe do CSN cumpra as tarefas que se atribui – tarefas antes realizadas pelos departamentos de Estado, de Defesa e outros. Além disso, ele diz ao mundo de que todo o poder está na Pennsylvania Avenue número 1.600, o que, por exemplo, faz com que os governos estrangeiros não se incomodem de trabalhar com outras agências americanas e dirigir todas suas indagações aos figurões da Casa Branca.
Além disso, apesar do seu peso atual, a equipe do CSN certamente não pode tentar realizar tarefas fundamentais que eram realizadas por outras agências e, ao mesmo tempo, se encarregar do planejamento, da coordenação e do fornecimento de assessores para o presidente, como se supõe que seja a sua obrigação. Isso não só provoca uma sobrecarga e falhas do sistema, como também suga o oxigênio de outros cantos da burocracia.
Por exemplo, o Conselho de Segurança Nacional, um lugar onde supostamente se fazem análises de alto nível e as tão necessárias previsões para o governo dos EUA, acabou destinando grande parte do seu tempo ao fornecimento de cerca de 500 notas internas para as reuniões absurdamente frequentes dos responsáveis do CSN no ano passado.
A abordagem de cima para baixo para o funcionamento do governo – com o problema de que se adotada, na realidade, ela impede o funcionamento adequado do governo – provoca muitas das tensões que atormentaram os secretários da Defesa (e de Estado) anteriores.
Tudo isso se agrava com o grupo dos principais assessores presidenciais que, na realidade, tomam e influenciam a maior parte das grandes decisões em matéria de segurança nacional que o chefe de Estado deve tomar. O grupo é formado por ex-assessores de campanha que atualmente ocupam altos cargos de confiança do presidente e são as pessoas a quem ele ouve.
Entre eles está o secretário de gabinete Denis McDonough, a assessora de Segurança Nacional Susan Rice, o vice-assessor de Segurança Nacional Ben Rhodes, e, periodicamente, conselheiros políticos como Valerie Jarrett. Todos eles são pessoas capazes, de grande perspicácia, que trabalham incansavelmente para servir o presidente e os EUA.
Mas, por outro lado, como ex-assessores de campanha, eles tendem a ver o mundo de uma perspectiva muito “nós e eles”, que excluiu outros funcionários da administração e até mesmo manteve à distância aliados fundamentais dos EUA.
A propósito, vale observar que às vezes o ímpeto para ter as coisas de duas maneiras pode levar a posições incômodas e um tanto ridículas. Uma que me veio à mente é a posição absurda dos EUA, negando que o Irã se tornou um aliado na luta contra o Estado Islâmico, negando que está trabalhando em coordenação com Teerã ou que isso não está causando algum impacto em outras interações com os iranianos, especialmente nas negociações envolvendo o programa nuclear do Irã.
Admitimos que fornecemos nossos planos de operações aéreas para os iraquianos e eles, por sua vez, os forneceram para os iranianos para garantir que não nos chocássemos nos céus do Iraque. O que leva ataques contra o inimigo comum com um objetivo comum. Agora, não se trata de uma aliança por definição, então não sei o que é.
Até agora, faltaram a clareza e a coragem para adotar medidas necessárias para conseguir os melhores resultados no longo prazo. É por isso que, embora aplauda a escolha de Carter, preocupo-me com seu futuro. Sua contratação não soluciona problemas de longo prazo diante do modo como o presidente gere os problemas da segurança nacional.