“Quando o mal existe, o esclarecido e o poderoso precisam confrontá-lo; caso contrário, ele cobrirá o mundo, como uma praga.” O norte-americano Paul J. Sullivan, professor da Universidade de Defesa Nacional e de estudos sobre segurança na Universidade de Georgetown, usou essa frase para externar a preocupação e a frustração ante o avanço do Estado Islâmico pela Síria e pelo Iraque.
Um sentimento compartilhado pela comunidade internacional e reforçado durante a última semana, após as quedas de Ramadi — um bastião iraquiano sunita — e do sítio arqueológico sírio de Palmira. Como uma praga, os jihadistas espalham o horror, subjugam populações civis a uma versão deturpada da sharia (lei islâmica), decapitam inimigos e impõem as fronteiras de um califado onde a lei da espada fala mais alto.
Os bombardeios da coalizão liderada pelos EUA não conseguiram debilitar o Estado Islâmico (EI), cuja crueldade chegou a incomodar Osama bin Laden, o falecido líder da rede terrorista Al-Qaeda. Para especialistas, somente uma ação militar contundente esmagará a facção de Abu Bakr Al-Baghdadi.
Sullivan vê o progresso do EI no Oriente Médio como sintomático. “Os extremistas buscam rápidas vitórias para manter o recrutamento. Muitos militantes abandonaram o grupo ao descobrirem como ele é psicótico e vicioso. As forças iraquianas não estão à altura da tarefa de combatê-los”, alertou, em entrevista por e-mail.
“O avanço do EI pode ser contido, caso a quantidade certa de força implacável seja aplicada por todos os lados, a partir do céu, do mar, da terra e do ambiente virtual”, acrescentou Sullivan, também analista do Conselho Nacional de Relações Árabes dos EUA. Ele acredita que a entrada da Rússia e da China na coalizão pode ser o fator-chave para reverter a tendência de expansão jihadista. O primeiro-ministro iraquiano, Haider Al-Abadi, visitou Moscou na última quinta para pedir ajuda do Kremlin.
“Eliminar por completo o Estado Islâmico e retomar regiões da Síria e do Iraque perdidas para os terroristas serão tarefas complicadas e, provavelmente, impossíveis”, sustenta Sullivan, que aposta na mudança do mapa do Oriente Médio. Especialista em segurança nacional e em política de defesa pela Brookings Institution, Michael O’Hanlon admite a limitação dos bombardeios da aviação.
“Se você não tem forças aliadas em solo, atingir o alvo torna-se difícil, e o inimigo também pode se dispersar ou recorrer à camuflagem”, observou. Além disso, lembra, o poder aéreo é difícil de ser utilizado dentro das cidades. “A menos que você queira lutar como Bashar Al-Assad (ditador da Síria), lançando barris-bomba e matando muitos inocentes. Não temos feito o bastante”, reconhece.
Sociopatia
O assédio do EI sobre Palmira, uma cidade de 4 mil anos considerada patrimônio da humanidade, coloca o mundo em suspense. Ontem, o ministro sírio para Antiguidades afirmou que os radicais não destruíram peças arqueológicas valiosas porque elas foram tiradas do local e levadas a Damasco antes da chegada deles.
Alguns estudiosos consideram que os jihadistas sabem explorar o marketing. Quanto maior a crueldade e o desprezo pela vida e por símbolos históricos, maior é o medo disseminado na sociedade ocidental. “Eles são sociopatas e psicopatas, não um Estado Islâmico. Isso não tem nada a ver com religião”, emenda Sullivan. O combate ao tráfico de drogas, ao contrabando de petróleo e de pessoas e à circulação de armas também pode ser um aliado de peso na eliminação da ameaça terrorista, segundo o analista.
“Outra medida é contrariar a narrativa do EI, a fim de se certificar de que jovens ingênuos vejam quão distantes as visões extremistas do grupo estão do islã.” Conselheiro sobre Oriente Médio e Terrorismo no Congresso dos EUA e autor de Guerra de ideias: Jihadismo contra as democracias, Walid Phares atribui a expansão do EI aos erros de Washington e da coalizão durante a ocupação iraquiana. “Isso permitiu que o Iraque caísse sob influência iraniana, após a retirada militar norte-americana, em 2012.
O governo liderado por Nuri Al-Maliki suprimiu os sunitas e permitiu que o EI marchasse para dentro de bastiões sunitas. As divisões estacionadas em terras sunitas entraram em colapso em Mossul e, mais tarde, na província de Anbar. Uma força militar sunita moderada deveria confrontar os jihadistas, mas toda a ajuda dos EUA vai para Bagdá e não chega às áreas sunitas”, explicou. Na Síria, segundo Phares, o fracasso se deveu ao não apoio a uma oposição moderada e secular a Bashar Al-Assad.
Resultado: o EI agora controla metade da Síria e mais de um terço do Iraque. “Seria um erro continuar a se apoiar no Irã para combater o grupo, pois isso vai escalar lutar sectárias. Precisamos de uma aliança militar árabe para intervir nos dois países. Após a remoção do EI, será necessário criar um novo governo livre na Síria e no Iraque e estabelecer um sistema federativo”, opinou.
FONTE : Correio Braziliense